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Writer's pictureJorge Vinicio

Manhãs de Setembro — A realidade não-romantizada de uma mulher trans



A nova série da Amazon Prime Video, estrelada pela cantora —  e agora também atriz —  Liniker vem sendo anunciada há muitos meses. A princípio, eu como alguém que já consome conteúdo LGBTQIA+, pensei que encontraria algo como Pose do Ryan Murphy. Mas me surpreendi bastante com os cinco episódios sobre essa mulher trans negra.


A série mostra a história de Cassandra, uma moto girl que acabou de alugar uma quitinete para primeira vez na vida se sentir em casa, mas é surpreendida quando descobre que teve um filho, agora com 10 anos, que precisa de sua ajuda.


A realidade de Cassandra, embora sua trajetória se assemelhe em alguns aspectos com a de outras narrativas de mulheres trans, é amarga, suja (já explico o que quero dizer) e autêntica. Manhãs de Setembro não abre brechas para que sua história seja romantizada. E diferente de outras personagens, Cassandra não tem sonhos de princesa, não almeja a vida de uma mulher cis.


Por ser tão realista, você fica em conflito em relação a Cassandra, porque ela é falha e humana. Não é uma mocinha, nem uma vilã e nem vítima. É apenas ela mesma e o reflexo do contexto social em que sempre viveu. Ao mesmo tempo, é interessante ver que os conflitos que nós temos sobre suas atitudes, são os mesmos que ela tem consigo mesma. E isso é muito bem construído pelo roteiro.


A fotografia, a direção e a direção de arte aqui fazem um trabalho ímpar em deixar a série suja. E nesse sentido, eu quero dizer visualmente. Não há um plano para esconder imperfeições, não há uma luz para deixar uma pele mais lisa, não há um cenário que seja como o que a gente está acostumado a ver na TV brasileira. Isso, não porque a história seja suja, mas para relembrar o que a sociedade impõe às pessoas pretas e trans. São Paulo é retratada aqui pelas ruas sujas, pelos prédios abandonados, pelas boates de bairro. Não há glamour.


Liniker atua incrivelmente bem, a ponto de nos fazer questionar sua atuação. Há momentos em que sua expressão não muda, e aí está o brilhantismo: ela interpreta uma mulher que já apanhou muito da vida e resistiu. Não poderia ter uma atuação melhor. O pequeno Gustavo Coelho já demonstra talento que muito ator de longa viagem gostaria de ter.


Manhãs de Setembro humaniza seus personagens e trás uma mensagem universal, mesmo num contexto nitidamente brasileiro. É uma história amarga, mas com muita doçura quando é necessário. Ela foge do maniqueísmo sobre indivíduos e aponta exatamente para a raiz da desigualdade e da descriminação: o sistema.


Todos os 5 episódios estão disponíveis na Amazon Prime Video.


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