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A Pluralidade Feminina de Adoráveis Mulheres



Há pouco tempo foi lançado nas plataformas digitais a nova adaptação do livro Little Women (que anteriormente tinha como título no Brasil Mulherzinhas), Adoráveis Mulheres. A alteração no título reflete muito sobre como a nossa sociedade trata as mulheres.

Mulherzinhas se tornou uma maneira de tentar diminuir mulheres e homens com trejeitos ou gays, como se a aproximação com qualquer característica dita feminina fosse razão para demérito.


O filme dá uma nova abordagem para a história, ainda se mantendo fiel ao livro, porém com um final mais condizente com toda a narrativa considerando a história da autora Louisa May Alcott. E, ao fazer isso, evidencia ainda mais a pluralidade feminina da narrativa.


Jo March é uma jovem aspirante a escritora e a protagonista da história. Com um senso rebelde em relação ao papel imposto a ela pela sociedade, Jo é uma mulher de personalidade forte, bem resolvida, sonhadora e engajada em sua própria jornada. Ela também é empática, dócil e solicita, o que poderia ser contraditório para uma mulher feminista se seguisse os estereótipos equivocados. Afinal uma feminista é apenas uma mulher que busca equidade entre os gêneros. E é exatamente essa a bandeira de Josephine.


Vivendo num ambiente majoritariamente feminino, ela reconhece a necessidade de uma contar com a outra, mesmo com as diferenças. E essa não é uma característica apenas de Jo — todas as mulheres da família March carregam consigo esse sentimento de sororidade, mesmo que nem sempre em doses ideais.


Jo é uma personagem muito real por assumir e aceitar suas próprias contradições, como, por exemplo, o sentimento de solidão quando ainda assim questiona o porquê da pressão sobre as mulheres a respeito do casamento. A propósito acho que esse seja um dos pontos mais altos da atuação de Saoirse Ronan no filme. Na verdade, ela só aceita isso quando entende que isso é uma construção social para deixar as mulheres sem alternativa.


Já Meg, a irmã mais velha interpretada por Emma Watson, tem desejos e percepções muito distintas do que Jo almeja. Ela sonha em se casar, ter filhos e enriquecer. Por mais que possamos atrelar isso aos aspectos machistas da sociedade na época, é belo como Meg não é condenada em nenhum momento por seguir esse caminho. Greta Gerwig, a diretora, mostra que ela apenas teve escolhas diferentes e que isso não a faz menos digna num filme feminista.


A única abordagem que questiona a atitude de Meg é na sequência em que ela é transformada numa “boneca” pela sociedade, mas não por ser “menos” que qualquer um, mas pelo fato dela não perceber ser transfigurada por uma sociedade que a vê exatamente como inferior.


Por sua vez, Amy é muito parecida com Jo, porém com os pés no chão e um pouco egoísta. Ela tem objetivos claros e questiona o papel da mulher na sociedade, todavia sem se rebelar contra o sistema. Amy segue as regras para poder controlar sua própria jornada. Para ela tudo bem se casar se isso permitir que ela conquiste seus sonhos, porém consciente de que é uma obrigação injusta e machista.


Amy, embora se adeque aos estereótipos em relação ao modo como se veste e se porta, diferente de Jo, não segue ideias como a de que “mulher é só perdão”, ou de que mulheres tem de ser meigas, gentis e dóceis. Ela tem uma personalidade direta e reta.


Das irmãs, Beth é a mais tímida e introvertida, o que a torna uma personagem enigmática. Ela gosta de tocar piano e isso é suficiente para ela. Não tem muitas ambições, mas isso não a torna inferior em qualquer aspecto, pelo contrário: ela é autossuficiente.


As outras personagens femininas, ainda que coadjuvantes, revelam extrema profundidade. É o exemplo da Marmee, a mãe das garotas. Ela se apresenta como uma mãe que faria tudo por suas filhas, é sempre gentil, como uma mãe é sempre representada. Mas como mulher ela também apresenta suas camadas ao, por exemplo, revelar como lida com sua raiva.


O filme também apresenta múltiplos exemplos de representação masculina: desde ao editor machista, até o sensível Laurie. Todavia, não deixa de pontuar os privilégios masculinos e a falta de empatia, até mesmo do jovem interpretado por Timothée Chalamet.


Em aspectos técnicos, o filme é igualmente brilhante: uma direção muito sensível e inteligente, como já é de costume pela Greta Gerwig; fotografia com planos lindos, como o plano inicial; direção de arte impecável e uma trilha sonora cativante.


Adoráveis Mulheres é um filme necessário quando ainda hoje há tantos equívocos sobre o papel da mulher na sociedade. Ele reitera, de maneira brilhante, que não há uma forma de ser mulher, embora claramente haja uma tentativa de moldagem social.


P.S.: Esse texto fora escrito por um homem branco através de suas percepção e posição social privilegiadas, então peço que apontem os possíveis equívocos. Espero que ao escrever esse texto não esteja tomando o lugar de fala de qualquer mulher.

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